Texto pra revista Mixmag que saiu entre julho e agosto. Matéria fria e tal, mas até que gostei.
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O quarto álbum de Eminem foi lançado em
2002 e sua música mais famosa, Without Me, dizia “nós precisamos de um pouco de
polêmica”. Durante essa época pareciam estar querendo separar o hip hop da
confusão (ou aproximá-lo de uma modalidade limpinha de confusão). O clamor de
Slim Shady pouco fez para mudar as coisas e aos poucos o rap gringo foi ficando
cada vez mais boa praça. Mas, de certa forma, a chegada do coletivo de
enfant-terribles californiano Odd Future Wolf Gang Kill Them All finalmente
mudou as coisas.
Liderado por Tyler, The Creator, o Odd
Future é formado por garotos cuja idade vai dos 17 aos 25 anos. Eles produzem
seus próprios discos, dirigem seus próprios clipes e gostam de insultar
celebridades, homossexuais e praticamente tudo que se move. Assim, chegaram a
um estrelato e uma atenção quase inédita da mídia em relação ao rap
independente.
Tudo começou no dia de natal de 2009 ,quando
Tyler Okonma, 18 anos, lançou seu primeiro disco, Bastard. A bolacha,
distribuída gratuitamente no tumblr do grupo, chegou a ser considerada uma das
melhores do ano seguinte pelo site Pitchfork. Daí, o OFWGKTA deslanchou.
Durante 2010, Earl Sweatshirt, Hodgy Beats, Domo Genesis, Mike G e Left Brain
lançaram álbuns mezzo solo mezzo colaborativos dentro da coletividade do grupo.
Parecia questão de tempo para que se tornassem “a próxima grande coisa” do hip
hop americano.
E de fato era. Bastou 2011 chegar para que
Tyler desse sua cartada mais certeira: o vídeo de Yonkers, primeiro single de
seu segundo álbum solo. O clipe que mostra Tyler comendo uma barata gigantesca,
depois vomitando, depois cego e por último se enforcando passou de vários
milhões de views no YouTube e fez do menino de 20 anos gente grande na música.
A polêmica foi além do vídeo indigesto,
dirigido por ele mesmo sob a alcunha de Wolf Haley (ainda há mais um
pseudônimo: Ace Creator). Na letra de Yonkers, Tyler manda Jesus parar de
choramingar, diz que gostaria de ver o avião do rapper B.O.B caindo e que vai
esfaquear Bruno Mars no esôfago sem parar até a polícia chegar. Suas letras
incomodaram não apenas os atingidos por elas, mas até mesmo gente inusitada
como a dupla indie Tegan and Sara, que reprovou seu conteúdo homofóbico.
Contudo, ele nega que odeie gays. “Só uso o
termo faggot [equivalente a viado] porque ofende as pessoas”, já disse. A
presença da produtora e engenheira de som lésbica Syd Bennett no OFWGKTA também
coloca em dúvida a suposta homofobia atribuída aos rappers. Parece mesmo o caso
de um garoto afim de provocar e chamar atenção.
Tem dado certo. A base de fãs fiéis do Odd
Future não para de crescer, dia após dia, e o grupo já tocou no Coachella, no
programa de Jimmy Fallon e tem outras aparições importantes em festivais
agendadas.
Falando coisas tão pesadas e desmioladas,
Tyler acabou expondo um lado da sociedade americana que talvez explique seu
sucesso. Seus rompantes violentos se relacionam perfeitamente com a nação que
comemorou a morte de Bin Laden como a taça da Copa do Mundo. Mais, trata-se de um
país onde tudo se pode pensar e quase nada se pode fazer e, até onde se sabe,
os membros do Odd Future têm uma ficha criminal limpíssima.
Em maio, Goblin, o segundo LP de Tyler,
chegou cercado de expectativa (e um contrato com a XL Recordings. Aqui no
Brasil, o disco sai pela Lab 344). Em uma semana, vendeu impressionantes 50 mil
cópias para um artista independente vindo do quase nada. O som é semelhante ao
de Bastard, cheio de beats minimalistas, rimas pouco convencionais e balbúrdia
adolescente exalando por cada verso. Uma audição atenta do disco faz o ouvinte
concluir que, de fato, afora toda a controvérsia, Tyler é um rapper e produtor
de talento. E, primariamente, é isso que sustenta o hype em cima de qualquer
artista.
No meio desse turbilhão de fatos novos, um
grande mistério ainda ronda o coletivo. Assim que o OFWGTA apareceu pela
primeira vez, um de seus membros mais importantes, Earl Sweatshirt, sumiu. Apontado
por muita gente como o melhor rimador do grupo, ele teria sido “escondido” pela
própria mãe numa clínica para jovens problemáticos na Samoa Americana. Vale
lembrar que Earl ainda não completou a maioridade - incrivelmente, aliás, ele
acabou de fazer 17 anos - e seu paradeiro nunca foi confirmado oficialmente.
Sites como o Complex e o Pitchfork, além de revistas como a New Yorker,
procuraram saber do garoto, mas até mesmo uma suposta entrevista por email com
o próprio Earl permanece inconclusiva.
Uma pena, porque enquanto fãs do Odd Future
saem gritando “Free Earl” por aí, ele poderia estar desfrutando do sucesso que
seus companheiros agora têm. Por exemplo, o cantor de R&B Frank Ocean já
foi escalado para participar do novo álbum de Beyoncé e até mesmo escreveu
algumas músicas para Justin Bieber. O prestígio vai além: em abril, o grupo
assinou um contrato com a Sony Records para lançar seu próprio selo, com
autonomia total de conteúdo e direção artística.
Atualmente, a única coisa que tem chateado
Tyler é a recusa da MTV em passar seu novo vídeo, She. Os motivos são meio mal
explicados, levando em conta que o clipe tem bem menos potencial ofensivo do
que Yonkers, e ele se ressente porque sonha em ganhar um VMA como diretor. Mas
apesar dos acidentes de percurso, das controvérsias e da marra de moleque, o
futuro parece doce para Tyler e sua gangue de lobos.
Fúria
e games em 140 caracteres.
Além das ameaças a Bruno Mars, piadas com gays e
estupro, Tyler, The Creator é também apenas um menino entediado com um twitter
popular (@fucktyler). Confira alguns dos posts mais sem sentido do rapper no
microblog:
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Esta próxima semana vai ser só
escrever raps idiotas, bater punheta e jogar GTA.
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ENTEDIADO. PRA. CARALHO.
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Sopa de sapatão.
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Se o mundo acabar, meu último
objetivo é arranjar uma pica para Tegan and Sara.
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FRIDAY DE REBECCA BLACK ME
DEIXA TÃO FELIZ! PORRA! ESSA PUTINHA É DEMAIS!
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Acabei de ver uma venda de
crack na Slauson Donuts. Que porra é essa?
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Eu sou uma putinha nojenta.
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Sonhei que Chris Brown e sua
gangue queriam encarar o OF. Acabou com todo mundo tomando sorvete.
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Muito agradecido de ter outros
talentos e não precisar ir pra escola. Foda-se a escola.
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Eu não idolatro Satanás, seus idiotas
comedores de pinto de merda.