Desta vez, uma coluna recente. Saiu neste sábado (19/06). Melhor postar agora pra aproveitar o clima de Copa. Fiz uma pequena mudança ali no meio, mas sussa. Nos próximos dias, volto a postar as colunas mais antigas.
Gosto de ler livros e assistir a filmes, mas confesso que não entendo muito de literatura e cinema. Sei o que me faz a cabeça, mas não me peça uma análise de cinema ou literatura com muito embasamento histórico e propriedade. Dança, teatro e artes plásticas me empolgam de vez em quando, ficam restritas a seu momento. Sendo assim, as duas artes que mais me agradam são a música e o futebol (e não me venha dizer que futebol não é arte – nem vou levar a sério nenhum argumento seu!).
Em época de Copa do Mundo, fica difícil não se concentrar na segunda paixão. Festival badalado nos Estados Unidos ou a estreia complicada do Brasil? Show surpresa dos Strokes ou a pipocada fenomenal da Espanha? Woodstock meio genérico aqui no Brasil ou a chance de ver Messi virando o grande jogador da nossa geração? Nesse caso, melhor tentar conciliar os dois amores. E nem é tão difícil.
Por exemplo, Jorge Ben tratou de regravar “Umbabarauma” com alguns dos atuais queridinhos da cena – Mano Brown, Céu, Anelis Assumpção, Thalma de Freitas, Ganjaman, Zegon e outros – para um novo comercial da Nike. Se Dunga relutou em chamar Ganso e Neymar para sua seleção, no futebol-moleque da música brasileira, saravá, a sintonia é boa. Tendo o futebol como parte integrante e importante da nossa cultura – onde Garrincha é tão ícone quanto Carlos Gomes ou Glauber Rocha –, não é surpreendente que a união do velho com o novo se dê em época de Copa, numa interpretação de um clássico sobre o esporte.
Jorge, aliás, é mestre nisso: desde os primórdios de sua carreira, não esconde sua paixão pelo futebol e, especialmente, pelo Flamengo. São tantas referências ao rubro-negro que me pergunto se isso não é a causa da mítica que ronda o clube. Vá lá: metade pro Galinho de Quintino e metade para Ben Jor. Claro que o interesse pelo esporte bretão (bretão?!) não é exclusividade do rei do samba-rock. De “Um a Zero” a “Partida de Futebol”, passando pelas homenagens do headbanger Andreas Kisser ao meu Tricolor, o futebol faz parte da nossa música assim como, sei lá, chocolates devem fazer parte da música suiça.
O motivo é simples: são duas artes que vivem do ritmo e refletem a cultura onde estão inseridas. É só analisar a música não-efusiva de Stockhausen e Kraftwerk e o estilo pragmático do fussball alemão; a ironia do rock inglês e a ironia de os inventores do football quase sempre falharem em Copas do Mundo e Eurocopas; a ópera e o calcio italiano, tidos como chatos e antiquados, mas de grandeza e alcance inegáveis... A malemolência do nosso estilo futebolístico acaba se fundindo perfeitamente com a malemolência da nossa música. Um não vive sem o outro.
Mas a paixão pelo futebol, como não poderia deixar de ser, não se restringe aos músicos brasileiros. Existem vários exemplos estrangeiros do encontro entre música e futebol. Nosso eterno rival Diego Maradona, por exemplo, encantou tanta gente que já recebeu uma homenagem do francês Manu Chao. Também podemos ver, frequentemente, as torcidas gringas adotando rocks populares como hinos. “Seven Nation Army”, do White Stripes e “Chelsea Dagger”, do Fratellis são exemplos recentes.
Mesmo os americanos, antes tão resistentes ao “soccer”, vão se rendendo. Minha camiseta mais legal é uma da turnê de verão de 2008 do Queens of The Stone Age, durante a Eurocopa. Ela traz um escudo da banda, com o nome do vocalista Josh Homme e o número 5 atrás, como se fosse um uniforme retrô. Sua banda-irmã, Eagles of Death Metal, também já foi trilha sonora de uma das propagandas mais incríveis da Nike, Take it To The Next Level, que mostra a carreira de um jogador numa câmera em primeira pessoa.
Nietzsche disse que a vida sem a música é um erro. Eu completo dizendo que sem o futebol também. Por isso, vamos agradecer aos céus o fato de ambas as artes se completarem tão bem. Salve Jorge e todos que já sacaram essa verdade. E boa Copa do Mundo para todos nós.