Friday, November 14, 2008

Mallu Magalhães

A introdução deste texto a seguir, sobre punk e tudo o mais, eu já tinha bolado há algum tempo, porque sinceramente acho que há uma relação com a atitude que a Mallu tomou. Mas, juntando com os dois últimos posts sérios, acabou ficando algo maçante, exagerado. Fez sentido, no entanto, unir os três, um atrás do outro, como se fosse uma série sobre o punk e a cena musical brasileira da atualidade.
Por outro lado, prometo parar com esse assunto durante um tempo. Todo mundo cansou de Iggy e Dee Dee.

***

As pessoas sentem-se fascinadas pelo punk, geralmente, por causa do som forte, ardido, destemido, ou por causa da atitude, “do it yourself”, as histórias que são contadas sobre gente como Stiv Bators e Dee Dee Ramone. Ou pela junção de ambos. Da minha parte, esse fascínio vem principalmente da segunda característica, da possibilidade de revolucionar com pouco, concentrado numa bolha que vai crescendo e dominando o mundo.

Por isso, quando Mallu Magalhães surgiu, foi uma coisa muito empolgante. Era uma menininha pequena, bonitinha, com pouca técnica instrumental, do tipo que você não bota fé, mas que conseguiu bastante atenção apenas com suas músicas gravadas toscamente, apesar de todo mundo saber que rolou uma “boa vontade” de pessoas mais influentes em ouvir (e divulgar) aquilo ali. Seja como for, foi a primeira vez que esse tipo de divulgação deu certo no Brasil, e a história da menina, em si, era interessante. Por mais rica que ela seja, por mais irreal que seja alguém de 15 anos ganhar uma bolada da avó no aniversário (pelo menos neste país), foi na raça que Mallu gravou suas quatro primeiras músicas, foi “metendo a cara”, algo muito punk, na minha opinião.

Então quiseram canonizar a menina, elevá-la ao status de gênio, vendê-la a qualquer custo. Algumas pessoas acharam que se tratava de uma “artista”, de um ser humano pronto para escrever músicas que realmente significariam algo, que valeriam a pena. Colocaram-na para aparecer no Jô, para participar de programas de rádio e do (chatíssimo) début solo de Marcelo Camelo e até chamaram Mário Caldato para produzir seu disco, que, instantaneamente, tornou-se um dos mais aguardados do ano. Aí, o encanto acabou. Como artista, Mallu é nula. Dando entrevistas, é constrangedora e infantilóide.

Bom, o disco apareceu, finalmente, e o melhor adjetivo pra defini-lo é “frustrante”. Porque, apesar de tudo, é um álbum com boas canções que não conseguem sustentar o resto.

A produção, por exemplo, é boa, feita por um dos melhores profissionais disponíveis, mas cai na vala comum, é clichezenta. Nem deve ser culpa do Caldato, porque, com sua publicidade exageradamente direcionada e pensamento retroativo (“sou Dylan, só gosto de Cash, não existe nada além de Brian Wilson”), Mallu e seu pessoal não deixaram outra escolha ao produtor. A persona da “artista” vem antes da qualidade das composições, da performance, dos timbres. Portanto, ninguém deixa você esquecer, nem por um segundo que seja, de que se trata de um disco de uma garotinha que escuta folk e country e curte fazer rabiscos toscos com lápis de cera.

Uma garotinha que escuta folk e country, curte fazer rabiscos toscos com lápis de cera e tem um fiapinho de voz. Pode ser que isso seja esperado e aceito pra compor a persona mencionada acima, mas não deixa de ser inaceitável. Os gemidos, os suspiros, os versos cantados em vários impulsos, tipo Dylan, se inseridos nos momentos certos, de vez em quando, dariam uma identidade à voz de Mallu. Como são constantes e sem critério, indicam apenas uma tentativa de camuflar pouca técnica vocal. É verdade que ninguém precisa cantar bem, mas geralmente, com cada Neil Young e Lou Reed, vem algum tipo de característica genuína, que corrobora aquilo que eles estão cantando (mal).

Mallu perdeu toda essa “característica genuína”, toda a autenticidade que possuía, quando virou “artista de verdade”, com aparatos de publicidade, disco lançado por compania de celular, e não foi capaz de suprir a demanda disso. Lógico, ela só tem 16 anos. Mas o fato é que na vida real ninguém irá considerar isso. Nossa “artista”, ao vender-se ainda tão verde e despreparada, deu armas carregadas pra qualquer detrator fazer uso quando quiser. Acima de todo o resto, é a primeira coisa que um artista de verdade, desta vez sem aspas, costuma evitar.

2 comments:

Unknown said...

Excelente texto. Em meio a tanta besteira que tem sido dita sobre Mallu Magalhães por jornalistas babacas atrás de polêmica, esse texto se destaca por não se apoiar naquelas piadinhas ou preconceito desnecessários. Acho a Mallu, de fato, talentosa. Claro, muito crua. A impressão é de que ela não estava preparada para isso, aliás, não está. Espero que daqui pra frente ela consiga amadurecer bem em relação a todo esse circo que foi armado à sua volta, crescer e aí sim, mostrar sua arte com um piso, com base, com sustento.

Unknown said...

Muito bom o texto, Mallu ainda por ser "criancinha" se deixou virar produto muito cedo, e isso desvaloriza muito o trabalho dela, agora é torcer para que ela consiga estar firme com seus propósitos, que não seja "fogo de palha".

 
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