Friday, July 30, 2010

Batismo

Quando meus pais foram tentar me batizar (eventualmente eles conseguiram), o primeiro padre disse que, por eles não serem casados, eu era o filho do pecado. Meu pai mandou o cara tomar no cu e molhou a mão do próximo padre, que fez o batismo feliz da vida. Eles não casaram, mas continuaram juntos pelos próximos 17 ou 18 anos, o que torna a história meio que uma anedota familiar.

Mas o motivo dessa história ter algum tipo de significância para mim reside no modo como o “conservador” (nesse caso, o batismo) e o “liberal” (casamento não-oficial, por exemplo) ficam se fundindo na minha vida. Veja bem: sou filho temporão, meu pai nasceu em 1949 e eu sou fruto da era digital, ou coisa que o valha. Minha índole me diz que as regras (quase) todas são no mínimo infringíveis, mas minha família formada nos anos culturalmente reprimidos do pós-ditadura sugere que o bom cidadão é aquele que segue o "curso natural" das coisas.

Do lado da minha mãe, que compreende meus tios e avó, temos pessoas vigorosas e empreendedoras, trabalhando feito camelos, colocando sempre o dever acima da diversão. Do lado paterno – ou seja, meu pai e meus irmãos mais velhos, porque não tenho muito contato com os tios –, as pessoas são práticas, objetivas e pragmáticas, atraídas pelo dinheiro fácil do mundo financeiro (se você for capaz de lidar com números). É fácil perceber que não há muito espaço para a imaginação em nenhum dos dois cenários.

Minha primeira lembrança é na escolinha, derrapando no chão de madeira da sala de brinquedos. Lembro da visão de um dos joelhos para cima, decorado com um machucado ainda novo, avermelhado. Não sei se tinham passado Merthiolate, mas me recordo de uma ou duas experiências chatas com ele. Depois disso, lembro de brincar com tatu bola e de correr do irmão mais velho e semi albino do meu amigo mentiroso, que teimava em me chamar de gordo (e eu não era!)

Nunca entendi por que eu era especialmente perseguido nos colégios, mas também sei que não era santo. Rir da cara dos outros sempre me pareceu algo divertido demais para não fazer. Mais uma vez minha conduta contradizia as normas não-oficiais da família Gesualdi Barboza. Meu pai sempre foi um cara mais ou menos pacifista, o que hoje em dia eu vejo como uma coisa legal. Mas quando ele me dizia coisas como “responde que você pode emagrecer, enquanto ele é feio e isso nunca vai mudar”, me sentia ainda mais desamparado. Claro que isso nunca vai afetar ele, pai! Teria sido menos traumático se tivesse me ensinado a dar uns murros na cara do imbecil.

Então, a irmã de um amigo, da classe do maluco que me perseguia, me ensinou um pouco de defesa pessoal. E sem levantar um dedo. “Chama ele de sundownzinho”. Perfeito. Chamar o garoto semi albino de sundownzinho me pareceu genial. É daí que lembro de correr dele, enfurecido. Ponto para mim, tirei o babaca do sério. E aprendi a maior de todas as lições na prática da discussão verbal: tocar no ponto mais fraco e humilhante do inimigo, sem dó.

No comments:

 
Clicky Web Analytics